a alguém que nasce:
carta de kima e para tereza

Belo Horizonte, 24 de agosto de 2020.

          Tereza,

Bem-vinda ao mundão.

Já tem alguns meses que você chegou e eu tô sofrendo por não poder te dar um cheiro. Mas essa noite sonhei que finalmente te pegava no colo. 

E eu não sei por que, já que o sonho é meu, mas você tava toda vestida de rosa, daquele tom que chega a cansar os olhos e que eu odeio.  

Até expliquei pra Rimenna que a roupinha de tigrinho que comprei pra você veio da sessão masculina, porque é lá que as roupas legais ficam. 

Enfim, o importante é que nesse universo cósmico do sonho a gente já se conheceu. E no sonho não tinha quarentena, nem nada. Só amor e abraço. 

Você é um bebê da quarentena e acho que você vai ouvir pra sempre essa história. E eu vou estar lá pra confirmar que o bagulho foi sinistro mesmo. 

Mas eu saquei qualé a tua. Nascer na quarentena significa colinho de mamãe e papai 24h por dia. E já tendo eu mesma usufruído desses cuidados posso afirmar que a madame está certíssima. Gruda neles e não solta. 

Tô escrevendo pra te confirmar o que te disse no sonho: que vou estar por aqui pra ajudar a te receber. Mas é até estranho dar as boas-vindas assim, prum bebê v1d4 l0k4 que resolveu nascer no Brasil em 2020. O que eu tenho pra ensinar pra você? Eu sou um bebê dos anos 90. Cresci na Era Lula, mamão com açúcar.

Fora que depois que a gente cresce a gente descobre que esse negócio de “adulto” nem existe e ninguém sabe muito bem o que tá fazendo na vida. 

Por isso acho que melhor mesmo é eu colar com você e ver o que você me ensina. Pelo menos é o que eu faço com seus pais. 

Um cheiro, um abraço, um sorriso bobo, um beijinho na cabeça, uma mordida no pezinho…

          Tia Kima

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Imagem da capa
DELAMARE, Iakima. Foto de acervo pessoal. 2020.

Iakima Delamare é jornalista, crítica e produtora de cinema.

Tereza é filha de Rimenna e Gabito.